Páginas

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

À procura do meu lugar


Privacidade não é uma coisa que faça muito parte da minha vida, mas já foi bem pior. Bem pior mesmo! Minha família é bem grande, são 11 tios por parte de mãe e outros 10 por parte de pai (é, não havia eletricidade no sertão dos meus avós...), minha casa é bem grande, resultado: sempre tem gente por aqui.

.

Desde a infância eu bolava lugares para ficar sozinha. A princípio era só para me esconder enquanto escrevia em meu diário, depois os diários evoluíram um pouco e viraram cadernos onde não só eu escrevia sobre passagens minhas, como era um meio de guardar as minhas reflexões e indagações.

.

Quando eu era bem criança, me escondia debaixo da cama ou dentro do guarda roupa. Debaixo da cama era desconfortável demais, fui logo para o guarda roupa. Acredite, eu conseguia ficar sentada dentro da minha parte e fechar a porta. Muito sem noção!

.

Aos meus 11 anos, sei lá, nos fundos de casa, parede com parede com o mercantil que o meu pai tinha, havia uma construção de uma casinha pequena e inacabada (minha mãe terminou a construção de lá deve ter uns 6 anos apenas) e a gente chamava de apartamento. No apartamento, as paredes eram riscadas, tinha brinquedo por todo canto e sempre que eu ia brincar de casinha com a minha irmã desistíamos depois que terminávamos de arrumar tudo. Quando queria ficar sozinha, ia pra lá à noite. Depois eu tive que mudar de esconderijo mais uma vez porque um primo veio morar em casa e ficou lá, mesmo sendo tudo inacabado. Anos depois, o apartamento foi cenário de outras coisas...

.

Outro esconderijo que tive foi na laje de casa. Havia a idéia de construir em cima e tinha uma escadinha pra subir. Durante anos vim em cima de casa para escrever, ou simplesmente ficar deitada olhando as estrelas. No Réveillon eu ficava acordada e ia pra lá para ver o sol do primeiro dia do ano. Eu tinha até um nome pra lá, mas não consigo me lembrar, depois procuro num dos cadernos.

.

Depois que eu entrei na universidade, ficava meio ridículo subir em cima de casa, ir para construções inacabadas... Eu tinha autonomia para sair quando quisesse ficar só, então saía. Acho que eu já devo ter comentado aqui o saudosismo que eu tenho do Dragão do Mar, lá era o meu lugar. Passei uma época maravilhosa e produtiva. Eu dava aula apenas duas vezes por semana e, quando estava livre, ia para a Biblioteca Pública para estudar e escrever as minhas reflexões, depois ia tomar um café, ou descia para um chope, às vezes assistia aos curtas que passavam de graça 18h. Aí, me encontrava com a Dayane e a Elvira que trabalhavam na Caixa da Pessoa Anta e pegava carona com elas pro CH. Nos dias em que eu não estava muito bem, ia até a ponte metálica e ficava lendo o que havia escrito antes na biblioteca.

.

O Dragão do Mar, além de ser o lugar em que eu gostava de ficar sozinha, era o meu lugar com a galera. A turma sempre se reunia por lá para ir ao Bixiga; o pessoal do trabalho das meninas sempre fazia happy hour nas sexta no restaurante Dragão do Mar (e eu sempre tava no meio); as quintas de reggae na Órbita em que mulher entrava de graça. Muitas histórias cômicas e trágicas: meu aniversário e da LaBelle na galeria do Tota; o famoso “beba do meu sangue” no bar do Avião (acho que foi lá); os namoros feitos e desfeitos. Sem falar do manual da paquera: fazer de conta que alguém da mesa está fazendo aniversário para chamar atenção para a gente, os garçons do Bixiga já chegavam perguntando de quem era a aniversariante da noite. E o manual da paquera na Biblioteca, que só conto para as íntimas, método 100% eficaz!

.

Sempre que estou no Dragão me vem uma energia boa dessa época. Hoje pensei em ir pra lá, mas por conta da greve de ônibus não deu (merda). Daí, lembrei que atualmente eu não tenho nenhum lugar para chamar de meu. Só escrevo em frente ao computador e não é nada tão reflexivo assim. Não pensar sobre os problemas nos faz ter a sensação que não temos de encará-los e já tem um tempo que eu ando covarde.

.

Hoje me vi com a necessidade de um novo esconderijo, um lugar novo para eu ir e ficar só com os meus pensamentos. E venho sentindo, cada vez mais, que esse lugar não faz parte de nenhum que eu conheça.

.

À procura do meu lugar...

Nenhum comentário: